07/02/2011

divina aventura

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará

         Muitos gostam de filmes de aventura! Daí passam aos grandes épicos históricos. Outras pessoas se emocionam com películas carregadas de sentimentos, nos romances. Tantas outras procuram cenas fortes, até de violência e não poucas vão atrás de erotismo e até pornografia! Gostos diversos, comportamentos às vezes lamentáveis, mistério humano! A grande aventura humana é carregada de emoções, acertos e erros, esperanças e alegrias.
         A Sagrada Escritura traz em seu bojo toda a riqueza do humano. Vista com olhos imprecisos, pode até mostrar Deus com sentimentos tão humanos quanto assustadores, como a violência ou o ciúme. Alguns poderiam até estabelecer uma censura para a leitura de certos livros! É que a Bíblia foi escrita por inspiração divina, mas com estilos humanos, correspondentes às culturas e pessoas que foram escolhidas pelo Senhor, sem cancelar inclusive os limites que as caracterizavam. O Povo de Deus não foi propriamente o melhor dentre os demais! Foi apenas escolhido gratuitamente, amado com amor eterno!
         A Bíblia pode ser contemplada como um espelho, no qual as situações humanas são iluminadas por dentro. Deus, através de sua palavra, não faz maquiagem nas pessoas, mas as renova por dentro, para que sejam melhores e felizes. E de humana, a aventura se torna divina, pois Deus entra no jogo dos relacionamentos humanos, permitindo-lhes chegar ao inigualável jeito de viver que é o da Trindade Santa, Pai e Filho e Espírito Santo.
         Como tais alturas podem parecer inalcançáveis, aprouve a Deus que seu Filho amado se encarnasse, vivendo no meio dos homens, sentindo as coisas com um coração igual ao nosso. A sua é a vida bem-aventurada por excelência. Quando abrimos o Evangelho (Mt 5, 1-12), no início do Sermão da Montanha, ali se encontra seu retrato, mais do que um código de comportamento. Jesus Cristo é a personalidade humana mais realizada. Dele se diz ter feito bem “todas” as coisas (Cf. Mc 7,37; At 10, 38). Soldados enviaram para o prenderem voltam de mãos vazias e coração repleto: “Ninguém fala como este homem” (Jo 7,46). Simão Pedro, limitado, mas sincero como poucos, após a multiplicação de pães, expressa o sentimento crescente: “Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos e reconhecemos que tu és o santo de Deus” (Jo 6,68).
Jesus é apaixonado pelo Reino de Deus, que chega aonde ele mesmo chega. Os valores do Reino são propostos como um nadar contra a correnteza, mas são eles a fonte de realização da pessoa humana. A Virgem Maria, no Magnificat (Lc 1,45-55), viu profeticamente uma situação diferente no mundo. Uma mudança tão profunda como a do Magnificat nunca foi vista! Mas o que foi feito dos poderosos de todos os séculos? Uma revolução aconteceu e acontece, mas a partir de dentro. Os nomes e exemplos que passam para as gerações futuras são os dos bem-aventurados e santos! Neles as mudanças efetivamente acontecem e se consolidam. Em nosso tempo, muitas revoluções prometeram criar um mundo novo, nas quais as mesmas situações de injustiça combatidas por seus líderes e programas se reproduziram com outros protagonistas. É que não adiantam leis e projetos sem homens e mulheres renovados no Espírito de Deus.
Homens novos buscam suas referências de vida nas bem-aventuranças. Para tais pessoas, Deus é a escolha primeira, e por isso são pobres, livres e desimpedidos. Um São Francisco de séculos atrás continua falando e atraindo jovens e adultos. Seus ideais não se limitam a usufruir de todos os prazeres possíveis, mas, atentos ao que lhes passa em torno, são sensíveis aos sofrimentos dos outros, choram, sim, pela mudança na vida das pessoas e no mundo. Por isso, mesmo quando não se tem a coragem para imitar, os que gritam e reclamam atraem misteriosamente! A mansidão dos pacíficos e a força da não-violência dos que possuirão a terra completa a tríade de propostas que retratam Jesus Cristo e o perfil dos que o seguem. As bem-aventuranças não param aí e se enriquecem com misericórdia, pureza de coração, paz e perseguição por causa da justiça. A escolha está em nossas mãos e com ela a possibilidade de transformar em divina a aventura humana!
           

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